O sol é para todos, de Harper Lee

by - segunda-feira, fevereiro 19, 2018


Em Por que ler os clássicos, Italo Calvino fala que um livro conceituado como clássico é, dentre tantas outras explicações, um livro que nunca terminou aquilo que tinha para dizer e que suas leituras são, na verdade, releituras. Enquanto era levada pela narração da pequena Scout Fincher em O sol é para todos, não consegui pensar em outra coisa senão nas palavras de Calvino. A primeira obra de Harper Lee é considerada um clássico não só da literatura norte-americana, como também da mundial, passando por todas as descrições de Calvino

Ao apresentar ao leitor a vida dos irmãos Jem e Scout Fincher, filhos do advogado Atticus Finch, Harper Lee está tocando em um dos assuntos mais delicados e presentes na história dos Estados Unidos: o preconceito. Nascidos e criados na pequena e conversadora cidade de Maycomb, O sol é para todos narra uma série de acontecimentos que chacoalham a vida dos irmãos Fincher: das tentativas de fazer o vizinho misterioso Boo Radley sair de casa ao momento em que seu pai é encarregado de defender um homem negro, Tom Robinson, de estuprar uma garota branca.

A narração por Scout Fincher, uma garota de apenas seis anos de idade, dá ao livro um toque delicado a um tema forte e espinhoso. A Maycomb apresentada no livro é a cidade pelos olhos de uma criança em formação e sem conhecimento de 1/3 das camadas que uma sociedade pode ter. Pelas entrelinhas, o leitor vai traçando suas características. É interessante notar que a escolha por uma cidade em Alabama não é coincidência: o sul dos Estados Unidos é e sempre será marcado pela escravidão.

Na primeira parte do livro, Scout mostra-se uma menina curiosa ao compartilhar suas aventuras ao lado do irmão e seu amigo, Dill. Harper Lee muda o ambiente tranquilo dos personagens na segunda parte, quando os habitantes de Maycomb reagem de maneiras distintas às atitudes de Atticus Finch na defesa de Tom Robinson. Sendo assim, se na primeira parte o leitor conhece Maycomb, é somente na segunda que o mesmo enxerga a cidade, que ganha vida ao mostrar as garras. Tanto Scout quanto Jem sentem na rotina os efeitos da decisão do pai. Atticus Finch é, aliás, um dos personagens de coração mais puro que já vi na literatura.

O sol é para todos discute com uma delicadeza única temas como racismo, direitos humanos e heranças (negativas) históricas. Ouso dizer que as leituras desta obra não se cessam, pois os sentimentos explorados na mesma permanecem vivos além das páginas. Trata-se, portanto, de uma história que se encontra não somente nas linhas ou entrelinhas, mas na pele de muitos.

Na minha estante há tempos, admito que adiei minha leitura de O sol é para todos o máximo que pude, encontrando no inglês bastante informal uma desculpa para tanto. No entanto, acredito que li no momento certo. Provavelmente um dos melhores livros que já li, digno de todos os elogios e prêmios recebidos.

Uma verdadeira obra prima! Palavras nunca serão demais para retratá-la, buscam "somente" se aproximar de toda a sua grandeza. 

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2 pessoas devoraram

  1. Normalmente não leio livros que não sejam de fantasia, mas sei que é muito importante abrimos nossos olhos para muitas outras coisas que são de estrema importância. Esse parece ser um livro realmente tocante e cheio de criticas presentes até os dias de hoje, como você disse. A forma como você escreve é bem clara, vou colocar O Sol é para Todos nas minha próximas leituras. XD

    https://www.newsfallenbooks.com/

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    1. Oi, Gabrielle!

      Faz bem sair da nossa zona de conforto também! O sol é para todos é um livro muito agradável, apesar do tema. Leia sim! :)

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